sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

À conversa com Vítor Santos, que nos fala de desporto…

À conversa com Vítor Santos, que nos fala de desporto…


                                       


        Iniciar desportivamente uma criança no futebol, não significa ensiná-la a chutar, a fazer golos e a correr. Significa incentivá-la a saber trabalhar em equipa, ter disciplina, conhecer as regras do jogo e respeitá-las. Além de ensinar conceitos sobre o jogo, a prática do futebol prepara-a para a vida.

Vítor Santos tem um percurso ligado ao desporto e nos últimos anos tem-se dedicado na promoção da ética desportiva. Os seus trabalhos têm ganho prémios e distinções a nível nacional e tem percorrido o país a fazer comunicações sobre a participação dos pais na prática desportiva dos filhos.

Embaixador do Plano Nacional de Ética no Desporto e assume que “tenho o compromisso de reportar todas as situações que sejam verídicas e coloquem em causa a integridade desportiva e os direitos das crianças”.

Falta cultura desportiva em Portugal?

Sem dúvida nenhuma. Portugal não tem cultura, nem educação desportiva. Vive-se muito os clubes – os 3 grandes, e esvazia-se todo o resto. Infelizmente, a única cultura existente é a de “ganhar a todo o custo” que está cada vez mais presente nessa sociedade. Este tipo de situações leva a comportamentos antiéticos e violentos, afetando negativamente o desenvolvimento desportivo.

O futebol português tem sido fértil em maus exemplos?

O futebol é a atividade mais mediatizada e escrutinada do mundo. Como qualquer outra atividade tem gente boa e má. O que se passa em Portugal, na minha opinião, é que não evoluímos em termos desportivos.  A própria imprensa desportiva não tem a qualidade de outros tempos.

As cenas que vimos no Porto – Sporting são exceções?

O clima da competição profissional em Portugal é de guerra. Durante a semana assistimos a personagens surrealistas, idolatra-se o diretor de comunicação, um líder de claque… tudo que acontece no jogo acaba por ser reflexo do que o rodeia. É muito fácil o confronto acontecer. Só se remedeia com fortes sanções monetárias.

Mas não foi caso único?

Não foi e nem será. Na iniciação e depois na formação ainda se exige á criança e ao jovem que sejam “chico-espertos”, para ludibriar o árbitro. São premiados estes gestos na formação. Estes atletas vão ser sempre um mau agente desportivo, um mau adepto, porque na sua vivência da prática desportiva foi-lhe incutido que o crime compensa. Depois também não entendo como os treinadores permitem tanta gente nos bancos. Eu queria sempre o menor número de pessoas. Só mesmo as indispensáveis. Eu assumia-me como o líder e por isso a única voz de comando e não queria ruído. Aprendi que era assim e assim partilho esse ensinamento. Hoje os treinadores deixam toda a gente falar, dar orientações, fazer ruído… O foco não é o processo mas o resultado! Devia ser precisamente o contrário.

E em particular no Distrito de Viseu?

Estamos a sair de dois anos atípicos e só mais adiante podemos ter dados concretos sobre o impacto que a pandemia teve no desporto. No entanto o futebol, que é o que mais acompanho, tem tido competição regular nos últimos meses. A verdade é que o desporto distrital é pouco valorizado e todos os clubes parecem querer fugir para os nacionais. Não reconhecem a força que o desporto tem no contexto regional e se os clubes se organizarem em termos de ética desportiva vão fazer do futebol um encontro de beirões por estes campos todos. A dinâmica do futebol distrital é sobrevalorizada em termos desportivos e mesmo sociais e económicos.

A distrital é preferível a um nacional?

Depende do clube. Na maioria dos casos sim. Em termos desportivos e económicos. Existe o estigma de “ser distrital” quando as competições intermédias são muito menos atrativas e vazias de público. A liga 3, por exemplo, é jogada a horas que afasta o público do jogo. A médio e longo prazo o jogar para a TV vai custar caro a esses clubes que começam a perder adeptos. O Campeonato de Portugal não gera receitas e o quadro competitivo é injusto.

A rivalidade saudável e o bem-receber o adversário são fatores decisivos e teríamos meia dezena de adeptos visitantes a cada domingo á tarde a passear e a ir ver o jogo. Mas deixar a competição para dentro do campo. Fora é o apoio positivo. As localidades ganhavam vida, economia, promoção dos artigos tradicionais e modernidade. Agora ninguém se desloca a uma localidade para ver um jogo e ser recebido de forma hostil e agressiva!

E em termos de formação?

A nossa situação não é diferente da do resto do país. Continuamos semanalmente a ver jogos a serem interrompidos por causa da violência nas bancadas. O foco passa do jogo para as bancadas onde crianças e jovens observam os seus pais a agredirem-se! A linguagem usada continua a ser a palavra agressiva, o insulto fácil quer para as crianças, árbitros e treinadores (ambos maioritariamente jovens). Crianças de 11 anos insultadas no desporto é uma realidade inconcebível e criminosa. Jovens árbitros a serem alvo de violência verbal igualmente. É tudo muito triste. É tudo muito triste.

Continuam a haver treinadores que não têm perfil, nem conduta para o serem. Não sei o que os prende porque não gostam de desporto e porque os clubes os têm! Os treinadores de jovens são especiais porque terão de ser pessoas disponíveis para trabalhar a longo prazo e devem inspirar os jovens mantendo-os motivados para a prática desportiva e assegurando que a sua participação seja realizada essencialmente por razões intrínsecas. Não é o que acontece.

Uma publicação sua nas redes sociais de um vídeo de futebol infantil, no Fontelo, deu a conhecer a quem não frequenta este espaço o muito do ambiente que é vivido pelas crianças na sua prática desportiva. Passaram-se algumas semanas sobre tal incidente e que foi feito?

A verdade é que o clube em causa tomou medidas e reforçou junto da sua comunidade qual o tipo de comportamentos que aceitam. Quanto a outras instituições penso que nada foi feito. Todas reconhecem o problema, mas que é difícil fiscalizar, punir, etc. Quando muitas vezes a presença destas instituições nos campos desportivos onde as crianças praticam desporto era já por si dissuasora.

No entanto também falta interromper os jogos e colocar as crianças de braços cruzados em silêncio a olharem para as bancadas. O durante é muito importante.

É no âmbito do envolvimento parental na prática desportiva, que tenho realizado diversas comunicações em clubes e associações para pais, treinadores e dirigentes.

Desde o lançamento do livro Educar o Sonho: ética e envolvimento parental na prática desportiva em 2018 até aos dias de hoje o que mudou?

Infelizmente as mudanças não são instantâneas. Os clubes melhoraram muito na sua organização e comunicação aos pais sobre o processo de formação. No entanto ainda existe muito trabalho a fazer de forma a que possamos encarar o jogo pelo jogo e em que o adversário ou o árbitro não sejam olhados como inimigos. O processo de certificação e a bandeira da ética trouxeram exigência aos clubes. Falta aplicar na prática a teoria toda. Mas muito já se faz. Esperemos que as Autarquias nos seus contratos programas também o façam. É muito importante e têm um papel de responsabilidade junto da comunidade. A melhor imagem é que atuamos e não fazer de conta que o problema não existe connosco.

O Vítor tem partilhado vários exemplos negativos e positivos. Tem feedback desse trabalho?

Sim. Hoje recebo muita informação de quase todo o lado. Tenho a obrigação de a saber interpretar e selecionar antes de a partilhar. É o que faço. Quando aceitei o compromisso de ser Embaixador do PNED sabia que tinha a obrigação de reportar e denunciar todos os comportamentos de que tenha conhecimento e sejam veridicamente provados.  A receção ao meu trabalho é excelente. Se por cá ainda existe muito o estigma de ser “da casa”, quando percorro o país, regresso sempre de coração cheio e de que valeu a pena a partilha. Tenho bastantes comunicações já agendadas pelo país.

A família é importante?

É fundamental. Não faz sentido ser de outro jeito. Mas fora do espaço desportivo. Quando saem as convocatórias por exemplo. No treino e jogo os pais são apoiantes. Nada mais. Quando ultrapassam esta função e que já é muito importante, estão a ser os protagonistas e não o devem ser. Têm de confiar no clube que escolheram. Por sua vez os clubes têm de ser responsabilizados pelos treinadores que escolhem e a quem os pais confiam os filhos. O comportamento de um treinador de crianças é muito mais de formador que de Mister.

Os atletas em campo têm de tomar decisões. Vão errar? Vão. Mas é assim que aprendem e os treinadores estão lá para corrigir no momento certo para o fazer. O que se pretende não é eliminar completamente os erros – tal não é possível –  mas diminuir progressivamente o seu número. Não façam é das crianças totós. Os pais e treinadores têm de dar mais autonomia aos atletas nestas idades. Os clubes têm de estar preparados para esta realidade da participação dos pais.

E é importante?

Decisivo. Ninguém nasce ensinado para ser pai de um atleta. A experiência diz-nos que tudo começa de uma forma lúdica e com o tempo o envolvimento começa a ser tão grande que toda a rotina familiar vai ser gerida em função dos horários de treinos e jogos do filho. A família abdica de muito do seu tempo para acompanhar o filho. Daí a irritação, muitas vezes, dos pais quando os filhos jogam poucos minutos. Temos de dar tempo a todos os intervenientes de assimilarem este processo.

Porque se começa muito cedo?

A prática desportiva do futebol chega a ser iniciada antes mesmo de haver contacto com a escola. As crianças adoram desporto, jogar, brincar e divertem-se antes mesmo de conhecer regras e atitudes que se devem ter em campo. Iniciar desportivamente uma criança no futebol, não significa ensiná-la a chutar, a fazer golos e a correr. Significa incentivá-la a saber trabalhar em equipa, ter disciplina, conhecer as regras do jogo e respeitá-las. Além de ensinar conceitos sobre o jogo, a prática do futebol prepara-a para a vida. Tudo leva o seu tempo. Não se pode é confundir prática desportiva com competição de alto rendimento. É o que acontece: o transfer do sénior profissional para a criança. É comum ouvir num jogo de crianças arbitrado por um(a) jovem: “ainda esta semana no jogo da liga dos campeões o árbitro roubou”. Isto faz algum sentido?! Diz muito sobre quem tem este tipo de afirmações.

Por isso é importante tirar o peso da competição para que todos cresçam em harmonia.

O cartão branco tem sido bem utilizado?

As boas práticas são sempre de valorizar. O cartão é uma ferramenta pedagógica e serve para promover essas boas práticas. Eu tenho lido que tem havido uma banalização do cartão branco – algo que já tínhamos discutido em alguns fóruns de decisão, quando se fala de retirar uma criança de campo para as equipas jogarem em igualdade numérica. Eu entendo e acho que esta não é a melhor forma de motivar as crianças. Mas temos de perceber porque acontece e que podemos fazer. E podemos começar por retirar a formalidade à competição. Em vez de retirarmos crianças, passamos uma, duas ou mais para a outra equipa e damos tempo de jogo e oportunidade a mais atletas de jogarem. Criamos situações novas às crianças tirando-as da sua zona de conforto que é importante para o seu crescimento. Depois vamos ver como lidam os treinadores resultadistas e os pais obcecados!!! Em Inglaterra tiveram a iniciativa Silence is Gold e a reação dos treinadores resultadistas foi vergonhosa. Os bons treinadores adaptam-se a todas as situações e vão sempre recolher material para o seu trabalho.

Enquanto treinador o que mais o marcou?

As crianças e os jovens. São amizades que se criam e ficam para a vida. Os menos culpados de tudo e os que são usados pelos adultos para as suas causas e objetivos. No desporto criam-se muitas amizades.

Pela negativa, sem dúvida, que os comportamentos de alguns treinadores da formação e dos familiares de atletas. No mesmo clube vi pai/treinador a agredir o treinador do filho!



Continua empenhado na causa da ética desportiva?

Mais do que nunca. A responsabilidade também aumentou. Não basta falar ou escrever umas frases bonitas. Temos de ser coerentes e apresentar soluções. A verdade é que tenho momentos que sinto que vou em contramão. Não entendo como as pessoas têm tantas desculpas para o indesculpável.  Começam por dar os parabéns pelo trabalho e depois vem sempre o, “mas”.

Projetos?

Tenho uma edição ampliada e atualizada de Educar o Sonho pronta. Durante estes três anos adquiri muito mais conhecimento e informação. Mas não creio que seja possível, sem um parceiro institucional, pelo que vou continuar a comunicar para quem me convida e a escrever para vós.


Fonte: https://www.ruadireita.pt/ultima-hora/a-conversa-com-vitor-santos-que-nos-fala-de-desporto-39097.html

#ética


quarta-feira, 16 de fevereiro de 2022

Show-off

           Nos dias em que vivemos, não é surpresa a publicação de notícias respeitantes a um conjunto de questões relacionadas com a violência. Estas situações merecem muita atenção por parte da Comunicação Social. Como o desporto está integrado na sociedade, também ele está sujeito a conviver com estes comportamentos. Daí que o policiamento seja um mal necessário. Os intervenientes no jogo, sejam eles treinadores, jogadores, dirigentes ou árbitros, precisam de se sentir em segurança para poderem desfrutar da prática desportiva, do verdadeiro jogo.

Na formação, os clubes tendem a esconder estes atos de forma a não serem importunados e a manterem uma imagem imaculada, dando a ilusão de que tudo corre sempre bem. A verdade é que semanalmente acontecem casos de violência verbal e mesmo física nos desportos praticados por crianças e jovens. Se estivermos com atenção e observarmos que o público destes jogos é, na sua maioria, constituído pelos familiares dos atletas, estamos perante uma situação muito mais gravosa.

A pressão que hoje é incutida em crianças de tenra idade é, no entanto, a grande diferença em relação ao que acontecia no final do século passado. Sempre houve campos e pavilhões onde todos temiam jogar pelo clima de terror que era criado à volta de cada jogo.

Os pais não acompanhavam os atletas e as situações ocorriam entre os clubes e alguns adeptos malformados e, muitas vezes, alcoolizados. Hoje, os pais são os adeptos e, à força de quererem vencer a todo o custo, adicionam a pressão sobre os filhos, os colegas e treinadores.

Por outro lado, a pressão exercida pelos progenitores leva à criação de expetativas exacerbadas que conduzem a desinteresse e mesmo frustrações muito precoces. O abandono da prática desportiva regista‑se cada vez mais cedo e cada vez atinge um maior número de jovens. Estas vão ser gerações de desportistas frustrados. Quando forem pais, vão ser mais desrespeitosos para com treinadores, árbitros e atletas. Entra-se, pois, nesta espiral de abandono cada vez mais precoce, que leva a pais mais pressionantes, que por sua vez levam a abandono mais precoce.

Em 1000 crianças‑atletas, só uma chega a profissional. Os que não atingem este patamar, como vão vivenciar o desporto?! Se a prática desportiva que conheceram foi a da vitória a qualquer custo, da pressão de ser o melhor, de não ter necessidade de perceber/pensar o jogo, não se pode esperar milagres. Provavelmente vão limitar‑se a ser mais uns adeptos fanáticos de sofá e de redes sociais de um clube de Lisboa ou do Porto.

Por tudo isto, seres humanos normalmente civilizados, educados e serenos chegam a transformar-se em verdadeiros holligans! Urge irradiá‑los dos espaços desportivos. Urge banir a violência física e verbal. Urge educar o sonho dos nossos jovens, mostrando que nem sempre somos os melhores, mas podemos sempre dar o melhor de nós mesmos.


Aquilo a que assistimos no F C Porto – Sporting através da televisão foi um triste espetáculo em que não há inocentes. Não vale a pena atirar a culpa para o outro. O que está mal é todo o sistema de funcionamento da competição e extracompetição. São pessoas a mais à volta do campo, pessoas a mais nos bancos, comunicação tóxica dos clubes, ausências da LPF e FPF, delegados que só buscam pedir camisolas, etc. De liga profissional tem muito pouco.

Preocupam‑se com o acessório e ignoram o essencial. Muito show-off.

Vamos ter esperança de que os órgãos competentes serão mesmo competentes e destemidos, e que os sistemas disciplinares e judiciais desportivos funcionem.

O ensino de valores no e através do desporto é um dever.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2022

TREINADOR: RELACIONAMENTO COM OS COLEGAS


• O relacionamento com os treinadores da sua modalidade, colegas de profissão, deve merecer uma atenção especial.

• O treinador deve dirigir-se aos outros treinadores de forma educada, com cortesia, boa-fé e respeito.
• O treinador deve colaborar corretamente com todos os elementos da sua equipa técnica, colaborando com todos eles e com a devida cortesia, procedendo de igual modo com os colegas das disciplinas relacionadas com o desporto.
• O treinador deve ser discreto em relação a discussões provocadas por diferenças de opinião e deixar as disputas graves para instâncias apropriadas.
• O treinador deve assumir responsabilidade pelas ações executadas pelos atletas ou por outros indivíduos que se encontrem sob a sua supervisão de acordo com o princípio de responsabilidade que aceitou no exercício da sua atividade.


Os pais também jogam

ÉTICA NO DESPORTO Os pais também jogam   Cfcs Carregal Do Sal #EducaroSonho #eticadesportiva PNED #eticanodesporto #ospaistambemjo...